quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

De "Viagem às nascentes do sentido"

"Ora, o processo de restabelecimento da saúde que começa então implica, em nome de sua eficácia, que não haja nenhum obstáculo à transparente relação que está por estabelecer-se entre o possuidor do saber - o médico - e "seu" objeto, ou seja, o "meu" corpo. Noutras palavras, tudo se passa estranhamente como se o êxito da cura exigisse a princípio o afastamento do enfermo, enquanto pessoa, à posição, tão silenciosa e mansa quanto for possível, de um simples observador. Nisso exatamente consiste o que se chama "coragem" diante da doença: saber manter-se à distância, pois - deve-se compreender - o fato de sofrer em alguma parte de si mesmo não constitui motivo suficiente para interferir, com o risco de atrapalhar aqueles que sabem verdadeiramente de que se trata! Mas, felizmente, ao passo que o dispositivo actancial assim imposto exclui que o "objeto" (o corpo dolorido) seja confundido com o "sujeito" (da dor realmente vivida), esse último - o doente -, ao queixar-se de seu corpo quase como se ele fosse uma coisa distinta da sua própria pessoa, é, ele mesmo, o primeiro a objetivá-lo".
Eric Landowski, Viagem às nascentes do sentido.

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