sexta-feira, 17 de dezembro de 2010
A volta
Meu retorno para Pelotas havia sido programado para quinta-feira. Assim, minha irmã foi na quarta para Porto Alegre, acompanhada de meu sobrinho para que eu e minha mãe, que permanecia lá comigo, pudessemos voltar bem acomodados, trazendo toda bagagem e sem depender de horários, táxis e essas coisas todas que se tornam um empecilho quando temos qualquer tipo de limitação. Liguei para meu médico e ele disse que gostaria de me ver mais uma vez antes do retorno, e isso seria possível apenas na sexta-feira pela manhã. Ok, então os planos foram alterados. De qualquer maneira na quinta fui até o Instituto de Cardiologia levar os doces de Pelotas que havia mandado fazer para dar como forma de agradecimento e atenção àquelas pessoas que haviam me acompanhado durante o período em que passei ali. Todos os doces em embalagens bonitas, com cartões de agradecimento pela atenção, dedicação e paciência dispensados. Já estava fazendo fisioterapia e retomando as forças com a cautela necessária e movido pelo interesse em me ajudar a avançar no que fosse possível, ao invés de ficar entregue sobre uma cama ou um sofá o dia inteiro. Havia selecionado uma quantidade enorme de livros, mas não consegui lê-los. Estranha essa relação da gente com os livros, dos momentos e estados de espírito que eles podem suscitar. Acabei lendo algumas coisas mais técnicas e deixando de lado as Lispector, Proust e Freud que havia selecionado. Ao chegar no Instituto de cardiologia fui direto a UPO e apareci na porta com as caixas. Foi um momento comovente ser reconhecido pelos técnicos, enfermeiros, médicos e funcionários que trabalham lá e que vieram até mim "perguntar se eu já ia embora"! Respondi que já havia ido, mas havia retornado para entregar para eles aquela lembrança simbólica pelos cuidados que eles prestaram a mim durante aqueles dias. E tenho a impressão de ter percebido uma espécie de felicidade brotar nos olhos de cada um deles, nem sei bem porque. Mas eu vi isso. Talvez porque eu estivesse bem; talvez porque eu tivesse vindo agradecê-los; talvez porque eu tivesse simplesmente lembrado deles. Me disseram que Seu Geraldo havia sido sumbetido a outra cirurgia e naquela tarde iria para o quarto. Também passei na secretaria da cirurgia e deixei doces para os médicos que me acompanharam. Na sexta-feira pela manhã, voltei para a consulta com Dr. Rossi. Como sempre ele foi agradável, conversamos sobre vários assuntos, ele me examinou e disse que meu quadro estava evoluindo muito bem. Brinquei com ele sobre meu "gerador de impulsos cardíacos" e disse que agora eu era movido a bateria. Que começava achar aquilo tão seguro que, mesmo que uma pessoa morresse, o coração iria continuar batendo! Planejamos as próximas consultas e procedimentos. Saí da consulta e passei no quarto de Seu Geraldo, que era dividido com outros três pacientes. Ele estava frágil, mas sentado. Me viu, reconheceu, me chamou pelo nome: "Lauer!" e disse que em breve iria para casa. Disse para ele que já estava bem e ia embora naquele momento, mas antes passei por ali para deixar para ele uma lata de bolachinhas, lhe desejar melhoras e um feliz 2011. Almocei em Porto Alegre e rumamos para Pelotas. Tive uma sensação de conforto e tranquilidade ao chegar. Pode ser a sensação da volta para casa. Minha mãe me ajudou a acomodar todas as coisas no apartamento e já queria montar a árvore de Natal, mas eu determinei que não, ela estava muito cansada e deveria repousar um pouco. Mães têm esse fôlego! Mas a gente deve ter zelo. Então fiquei só no apartamento, depois de muitos dias sem estar só. Avaliei um pouco minhas limitações momentâneas e acredito que sejam elas que me ajudarão em algumas "escolhas" que talvez eu precise fazer daqui para frente, muito embora eu não acredito muito que a gente "escolha" de forma consciente as coisas. Abri as janelas para deixar entrar o ar fresco do entardecer, sentei numa poltrona e comecei a ouvir Iggy Pop "Les Feuilles mortes".
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